Que saudades do tempo em que ainda sonhava

IM000163.JPGOs dias eram mais curtos, passava mais tempo na cama a recuperar de noites com cervejas na mesa, com o corpo expedito nas pistas. Na loucura dos anos desgovernados da irresponsabilidade, revestida de sonhos.

Fosse em Espinho a ouvir pistas do Turismo ou em Aveiro doutrinas do marketing, existia em mim um tecido de sonhos, uma esperança abstracta do futuro que ainda não havia chegado. Nuns dias imaginava-me com umas dificuldades imensas, a ser tolhido pelos receios e a não me desenvencilhar em nada digno de registo; em outros imaginava-me em fatos glamorosos a percorrer os hotéis mais luxuosos em reuniões e formações, em negócios e resoluções. Não era sempre coerente, todavia alimentava-me sempre um desconhecido magnetizante, sedutor. Era vestido com as cores que eu desejava, por ser intangível era propriedade do meu imaginário. Dispunha do direito de fazer dele tudo o que me aprazesse, de viajar por ele com a leveza de um pássaro sem fronteiras na vertigem das nuvens.

Mas o amanhã chega. Chega sempre. E chegou, afortunado por uma rápida resolução de futuro, por um emprego que se desembocou ainda sem licenciatura concluída. Era, afinal, bem-aventurado. Felizmente, felizardo. Sorri para o futuro que, em certa parte, já era presente. Não demorei períodos longos atrás das oportunidades, ela surgiu-me numa porta entreaberta e eu cacei-a, fiz dela minha posse. Não pude deixar de emanar sorrisos, uma certa altivez pela minha posse de funções importantes. Porém, não deixei alienar-me do mundo ao meu redor, do jugo das empresas, e tentei sempre estar a par. Participar em experiências que me aproximassem de outras realidades de negócios, de outras pessoas envoltas em ideais diferentes. Achei que me enriqueceria e enriqueceria o meu trabalho. E  achei bem, foram experiências trajadas de botija, com boquilhas para o oxigénio. Os meses seguintes foram uma catadupa de ideias, de movimentos ferozes para isto e para aquilo.

Hoje, visitei alguns sites de emprego, na procura de desafios que pelo menos me alentassem o ego, que me fizessem pensar que, mesmo não saindo de onde estou, existem possibilidades para além da janela onde bate a chuva, criando uma melodia de melancolia, uma música de dormência. Mas não existem. As possibilidades reduziram-se a metade. E mais de metade da metade é para estágios, alguns sem remuneração. Outros com o apoio do estado, que sendo um estado que não defende a nação, não alenta nem um alentado.

Onde estão aqueles sonhos que sempre me moveram? Estão aqui, mas o cinzento do céu, o apreço da realidade, estão a sodomizá-los, a encolhê-los. Eu não vou desistir deles, pois estou-me a marimbar para o dinheiro e para os luxos. Não quero passear grandes carros nem ter empregadas ucranianas a fazer-me os favores todos, só quero um tecto que me abrigue, um computador onde escrever, algum dinheiro que me dê para viajar. E desafios. Quero tanto hoje como nos tempos de faculdade, desafios. O dinheiro não me move, só me entristece. Os desafios é que fazem tudo isso ser esquecido. Trabalho de graça para projectos que me desafiam. Não posso é ser burro para toda a vida. Algum dia terei que perceber que o dinheiro também faz falta. Que não possa viver eternamente no contar dos tustos, a contrariar os que me vêem como rico. Sou faustoso, sim, mas é na vontade de viver, de me desafiar.

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4 thoughts on “Que saudades do tempo em que ainda sonhava

  1. Temos todos saudades desses tempos….. Onde os sonhos pareciam certezas e as incertezas motivações para continuar! Grande Abraço! Ps: CARREGA BENFICA

  2. E lá vem o peso da adjectivação: podes não ser um jovem rico, mas és um rico jovem… se considerarmos riqueza apenas dinheiro, caso contrário és um rico jovem “rico” (por todos os que te rodeiam, pelo menos).

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