Ilusão

Ilusão

Não é fácil sermos quem somos, livres, num mundo que vive na ilusão de replicar os casos de sucessos, os ditos mais certos, ou marcar os mais fracos.

Termos a coragem de afrontar a sociedade com os nossos traços de personalidade, com o vigor das nossas intuições, é asseverar ao mundo que a ilusão de nos desenhar à sua medida finda ali. Nós, comummente, somos meros desenhos, esboçados pelo que nos rodeia. Há os pobres, os ricos e os de classe média, há os instruídos e os analfabetos, os mais perspicazes e os mais distraídos, os mais apaixonados e os mais frívolos, os mais amigos e os mais solitários, e quem sair desses padrões necessita ser rotulado de alguma forma. E, normalmente, o rótulo vem em forma depreciativa, por consequência da ilusão de que tudo já havia sido adivinhado e a vida podia prosseguir na pacatez do nada de estranho.

O nosso mundo, o que sentimos e vemos dentro de nós, está limitado pelas fronteiras da ilusão social que se cria. Desejamos ser mais do que somos, galgar essas barreiras por outros criadas, mas esbarramos no receio da solidão, do abandono. Não é fácil encontrar a coragem que nos permita ultrapassar esse temor, atirarmo-nos ao mar das vivências, guiados por tudo o que somos. Ficamos claustrofóbicos e presos nos pensamentos, pois olhando os paralelos anteriores, vindos dessa ilusão de uma sociedade já inventada, parecemos loucos. Parecemos muitas pessoas. E a sociedade ilusória onde vivemos não gosta de pessoas que são muitas pessoas. Deturpa a ideia de que todos temos um rótulo.

O nosso mundo, o que vivemos e assistimos, é todo ele uma ilusão. Onde somos bons ou maus, no máximo medianos. E  não tem que ser assim. Podemos ser bons e maus, até assim-assim, mas sermos sempre a mesma pessoa, dentro de diferentes pessoas. Todos temos heterónimos, mas poucos temos a coragem de fugir de uma ilusão universal. A de que tudo já está inventado, em relação à verdade das coisas.

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